sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Meu Interior

(...)

Fui no lixão hoje.
E não havia nada reciclado,
Tampouco cheiro de jasmim,
Lá no interior de mim.

Era tanta sujeira acumulada,
Ratos, baratas,
E uma pessoa se escondendo.
Quando entrei, os abutres já sem bico,
Faziam festim num coração aberto.

Nem quis ver mais aquela cena,
Então, senti um odor indescritível
Vindo das profundezas.
Temores, desejos, incertezas,
Vagavam a procura de alguém,
Talvez morto.
Não sei dizer.

O solo estava encharcado,
Húmus misturado com suor,
Sangue e lágrimas de um passado não vivido.
Tentei não vomitar
E regurgitar o meu ego ferido,
Era tarde.
Os insetos pousavam em mim,
Sentia-me como uma secreção,
Colada num papel higiênico rasgado.
E não estava muito longe de ser isso.

Se fosse amigo das palavras,
Escreveria até um livro,
Mas era como um catador juntando versos,
E não os venderia pra ninguém.

Naquele lugar, confesso,
Eu não queria passar o Reveillon.

Lucas Matos

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Fim do Mês

"Eu tenho medo do fim do mês"

(...)

A fatura do cartão chegou,
Junto veio o aluguel vencido,
A conta da lanchonete,
Da internet,
O empréstimo do banco.

De manhã o carteiro deixou o telefone
A luz e a água pra cortar,
A escola do Júnior pra pagar,
O barbeiro também me deu um corte.

A mulher me cobra o do salão,
Eu reviro os bolsos, a mente, o coração,
Peço ao vizinho emprestado,
Mostro a carteira vazia,
Ele me vira o rosto,
E mostra a dispensa aos pedaços.

Meu filho tem medo do escuro,
Minha mulher dos juros,
Eu, do fim do mês!

Lucas Matos

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Todos os Poderes


"Que a Força esteja com vocês!"

(...)

Antes de ter minha Cryptonita,
Era diferente.
Lutava em batalhas vencidas,
Malhava em ferro frio,
Enxugava gelo,
Carregava balde furado,
E vencia sempre o Tédio Imortal.

Fazia algumas missões secretas,
Arriscava o meu pescoço,
Salvava qualquer donzela indefesa,
Certa vez até uma meretriz,
Que estava presa, coitada,
Numa torre.

Eu tinha amigos valentes,
Habilidosos, sonhadores,
Verdadeiros...

Alguns deles se foram.

E para sobreviver agora
Uso disfarce,
Pareço um homem cansado.

Casado, uso todos os poderes,
Até aqueles, que eu não sabia usar.

Já venci muitos gigantes antes,
Mas só o seu olhar congela,
Perco minhas forças, as palavras...

Não é fácil ser heroi na frente dela.

Lucas Matos

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Debaixo da sombrinha

"No fim, é tudo hipocrisia"

(...)

Eu queria dizer outra coisa,
Mas o que vi era porcaria.

Passava de meio dia,
Quando, na calçada empoeirada,
Em meio a uma quinquilharia,
Um ser jazia vivo, numa casa improvisada.

Não havia beleza na cena.
Era ela, mendiga suja e velha,
A defecar em minha frente.

A sombrinha velha era o banheiro,
Não havia descarga,
Só o cheiro repugnante dela.
Sem blush ou batom
Cabelos desgrenhados, amarelados,
Crespos e quebrados,
Parecia até com Monalisa.

Ela não almoçaria em restaurante,
E eu não a levaria pra sair.

Talvez não tivesse plano,
Nem de saída,
E nem tivesse saudade,
Talvez tivesse um pouco mais que a vida,
E a anímica anêmica vontade!

Lucas Matos

domingo, 19 de dezembro de 2010

A noite que não dormia

"Dorme."

Era sempre o vento a bater na janela.
A folhagem virgem a instigar meus instintos
Meus olhos latejando, bocejos.
Havia uma aventura a viver.

Via morcegos açoitando ela,
Cansada, passava lenta e passivamente,
Como se ninguém quisesse que se fosse.

Eu não,
Implorava que chegasse o dia,
Aquela noite fria quase me encarava,
Por aquela pequena janela fechada.

No fundo, um inseto cantava.

Meu Deus! A noite não passava!
Chopin me ninava os sentidos
Embora só,
Sentia um dó com ré sustenido
Mas o sono desejado
Não vinha nunca para o meu alívio!

Virava de um lado
O outro, amassado, me irritava,
Contava carneiros, dinheiro, cantava
E eu pensava apenas nela.

Dormir não deve ser permitido
Aos que amam!

Lucas Matos

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Oblação

"O amor se rende"

Como uma ovelha negra no pasto
- Humilhada e deixada de lado –
Distante do rebanho, fiquei.

A mente como um motor quebrado,
Faltando uns dois parafusos,
Parou.
Eu remoia o mato.

O vento a secar os pelos – cabelos
E eu a tentar subir a colina.

Estava frio,
Mas naquela altura da vida
A frieza era uma companheira fiel,
E a lã já não aquecia,
Só o teu corpo no meu...

Foi quando você saltou para o outro lado da colina
E eu, manco, marcado,
Já não conseguia pular.
Seria feito sacrifício para alimentar um povo.

Exaurido
- Em algumas horas seria abatido -,
Mas você voltou, e... meu amor ...
Não me salvou,
Morri naquele dia com você!
Lucas Matos

sábado, 11 de dezembro de 2010

"Eu não uso pele de ovelha"

Algumas pessoas questionam o meu estilo poético (ou diria), patético, que é chato, rimado demais, meloso, passado da validade... e eu gosto disso. Assim eu percebo que mexo com elas, mesmo que de uma forma negativa. Ainda bem que o poeta vive de críticas; elas me fazem crescer de verdade. Agradeço aos meu amigos que me alertam quando meu estilo "congela", obrigado mesmo!

Do Lobo

Não se ensina truques velhos
À velhas fontes secas,
pois não se acaba a sede do sedento
nem o velho nunca mais (se) surpreende!

O veterano sempre tem uma cartada
Como o juiz, um veredito,
E até o mestre tem um golpe,
Que nunca ensina ao seu discípulo.

Mas o lobo, espreita na colina.

Chega o dia em que o jovem lobo cresce
Os pelos engrossam, o uivo acentua-se
As presas ficam afiadas.
Então o jovem lobo ataca,
Arranha o rosto do velho,
Cospe na cara, morde o rabo,
E dá-se como vitorioso.

Mas o velho lobo não morre,
Finge-se de morto,
Truque novo,
e quando vem a mordida final
O Velho lobo levanta,
Sorri, e vai guiar outra matilha.

Lucas Matos

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Pagamento




"O que daria o homem pela sua alma?"

Marcos 8.37


Pagamento

Não devo muita coisa
apenas minha vida inteira,
para um homem muito melhor do que eu
que todas as batalhas venceu
pendurado num madeiro!

o sangue rubro ainda pinga no chão
dentro do meu coração já fez um poço
e eu nem conhecia aquele Moço
que tão encarecidamente me amou!

Essa dívida não posso pagar!
Não é como aquelas do bar
ou da quitanda,
só dando a minha vida pra quitar!

Sabe de uma?
Nunca deixei nada pendente,
vou levar a minha cruz daqui pra frente,
e trocar por uma vida diferente!

Lucas Matos

domingo, 5 de dezembro de 2010

O Gênio

Einstein - Talvez o responsável pelo aparecimento de tantos blogs por aí...


Não ser tão inteligente pode ser de grande valia
Einstein, por exemplo, nem sabia fazer poesia
talvez nem soubesse fazer um bolo,
só fazia mesmo cálculos, tolos...

E o que dizer de Mendel?
até que conhecia um pouco da vida,
mas não era poeta, então, a teoria
das espécies, era como uma piada,
melhor seria em poesia.

Não sei do paradeiro de Bháskara
nem se ele amava alguém,
mas seu teorema, como o de muitos outros também
não explica nem de longe as mulheres!

E, me perdoe Picasso,
mas suas obras sequer chegam perto
da mais imperfeita curva de uma mulher!
Se Leonardo soubesse disso,
terminaria de pintar a Monalisa
e mais depressa ainda,
voltaria para o conforto de sua cama
e concederia à sua dama,
pinturas mais bonitas em seu corpo...

Ah! Os gênios que me perdoem,
mas não há maior inteligência que essa:
beijar uma mulher sem pressa!

Lucas Matos